Identitário

3 de março de 2015 7 comentários


Não! Eu não posso ser eu mesma.
Sou a dama de ferro inveterada.
Incansável como Pagu,
não sou mais que o meu estilo camaleão.
Sou Brigitte fora do cinema francês.
 Com um coração selvagem, vivo no espelho de Lispector.
Retraio-me nos holofotes de mim mesma
e em todas as outras que eu consigo ser.
Sem ser heroína na guerra, estou sempre em batalha.
 Deus salve a Rainha! A rainha no meu reinado.
Arquiteta de vãos livres,
porta-voz de mulheres,
meu autorretrato é pintado todos os dias
em cores fortes, cortes de Almodóvar.
 Estigmatizada como Frida,
sou generosa no modo de ser da minha devoção.
Sinto-me negra, branca, meio amarela,
um pouco pintura,
outras vezes, grafitada em paredes de concreto
quase imperceptível.
 Meu vestuário desconforta-me,
mas minha nudez não basta à minha dramaturgia.
Tenho alguns vestidos-envelope no armário
que é para quando eu precisar.
Nunca serei ícone de moda alguma,
mas sou meu estilo único e transparente
e sei que sou copiada por outras que nem imagino.
 
Sou poeta de versos livres,
que de tão livres voltam à introspecção,
encarcerados, sem identidade, ocultos,
algozes de muitos rostos mal compreendidos.
 Queria a voz de Elis em meu canto
para acordar-te em dias de chuva,
(no teu quarto)
porque em dias de sol,
sou síntese, menos eu.
 Negligencio-me quanto não me vês.
por não ser mulher de novelas, nem de longa,
nem ginasta, nem tocadora de piano.
 
Mas escrevo!
Escrevo para mim e para ti.
Fotografo-me em seus cabelos grisalhos,
quando por mim passas.
Na tua pele queimada de sol
(que é só tua).
 Ainda canto rock para dormir,
para deixar de ouvir tão arranhado som que produzes.
Como mulher de medalhas, na minha boa vontade,
danço ballet em teu magro corpo
e em teu farto gozo.
 
Quase nada tenho.
Tenho um barco, um aeroplane de quinta
e uma sanfona com toque de fole.
Meus navios estão sempre em alto-mar.
Como florista, encontro-me comigo sem estar presente.
E mesmo ausente,
sendo todas elas e nenhuma outra,
sei que serei forte ou fraca,
chefe da minha cozinha,
poeta mineira de meus desejos,
esquecendo-te quase todos os dias.
Tão raro, quando me lembro,
sou Graça, Maria, Marília...
filha da Isa, irmã da Bia
e, de vez em quando,
sou apenas quem eu quero ser.
 
(Lila Morena)
  
"Nunca estou longe do piano,
me alegro quando estou triste" (Tchaikovsky)
 
 

7 comentários:

  • Unknown disse...

    Belíssimo poema! Nele percebo o descortinar da alma feminina quando ao longo da vida descobre os vários "eus" que uma mesma mulher carrega dentro de si....

    bjs,
    Magá

  • Anônimo disse...

    Como eu sei que este e quase todos os poemas são para mim...fico lisonjeado.

    Vamos mergulhar em Maragogi, Marília?
    Te amo.

    Caiafa.

    Leia isto, Gata: http://www.fab.mil.br/noticias/mostra/21673/DIA-DAS-MULHERES---For%C3%A7a-A%C3%A9rea-tamb%C3%A9m-%C3%A9-lugar-de-mulher

  • Blog Café com Letras disse...

    Caiafa,

    obrigada por ser este meu leitor fiel.
    Por acompanhar minha escrita, embora eu saiba que você não gosta tanto assim das redes sociais.
    Obrigada por ser meu incentivador e a fonte de inspiração para muitas coisas BONITAS na minha vida.
    Você é um amor pra toda vida, mesmo que nas pontes aéreas. A gente vai se amando e vivendo o hoje. O presente é passado.
    O futuro é agora.

    Beijo.

    Lila.